sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

Passou

Não me interesso por esse assunto...
Será que sou arrogante?
Minha garganta dói
Minha caneta corre
E eu não sei como responder
Entendio-me
Julgo-os
Desligo-me
Será que sou arrogante?
Antes tudo corria bem
Então me perguntei
Busquei
Encontrei
Voltei
E percebi que não sou mais o mesmo
Isto não faz o isso menos
interessante
Refleti
Senti
Tentei
Esse assunto não me interessa.

Lua Formosa

Me faltam palavras pra falar da Lua
Tanta gente já falou
Tanta gente vai falar
E a Lua
Formosa a brilhar
Nem sei o que dizer
Nem sei o que contar
A Lua já foi cantada
escrita
louvada
estudada
E eu a divagar
Tanta beleza, meu Deus
Tanto esplendor
É a Lua o motivo
De eu crer no Senhor
É a Lua magnânima
A brilhar com fervor
Pairando sobre as cabeças
Exalando amor

terça-feira, 18 de dezembro de 2012

Boicote

Um dia ele acordou outra pessoa. Olhou-se no espelho, não reconheceu aquela cara, que outrora fora espinhenta, olhando pra ele. Os cabelos, antes indigenamente lisos, estavam grossos e modelados pelo travesseiro. O nariz um pouco mais grosso, os lábios menos corados, os olhos mais densos e, o que mais apreciara, a pele que um dia pedira a Deus.
   - Bom dia!
   Alguém bateu do lado de fora de seu quarto, ele, confuso, respondeu maquinalmente.
   E sua voz soara diferente. Engrossara pouca coisa.
   -Vem tomar café!
   Convidou a outra pessoa.
   - Já vou...
   A voz.
   Embaraçado, começou a trocar de roupa e, sem querer, a cantarolar uma música que ele nunca esperara cantar. Julgando-se, vasculhou a mente atrás das músicas que era habituado a gostar e descobriu, ao tentar reproduzi-las com sua nova voz, que não tinham a menor graça.
   Já vestido com as roupas que não cabiam mais em seu gosto, resolveu enfrentar a outra pessoa da casa, imaginando o que esta diria ao vê-lo desse jeito.
   - Olá, o Antônio ligou e...
   Assunto em cima de assunto ia sendo puxado, como se ela conhecesse sua nova forma de muito tempo. Não conseguindo mais perder-se em seus tentadores pensamentos, ele percebeu que se interessava muito por cada palavra que lhe ia sendo oferecida.
   Respondia naturalmente aos estímulos que lhe eram lançados, como nunca pensara antes. O que dizia era desconhecido à sua boca, não eram mais produtos daquela torturante caixinha preta que teimava em conservar dentro do cérebro, donde tirava todas as falas que, de alguma maneira, lhe protegiam. Até lhe vinha à mente dizer tudo como dizia ontem, mas o ímpeto do costume era fraco ante o deleite de correr o risco de ser.
   A outra pessoa surpreendera-se enfim. Ele, envaidecido, ia sendo acometido de certo prazer de ser admirado pela nova pessoa que estava sendo. Jazia tão fascinado por si mesmo que nem notou que comera e bebera tudo com gestos que não lhe pertenciam antes.
   Apaixonado, ele passou o dia arraigado, analista ensimesmado, tentando a todo custo mostrar a todos o quanto estava mudado, quão diferenciado, tanto melhorado! Pobre de mim...
   À noite, ao olhar-se no espelho, tremeu de medo ao ver a si mesmo espinhento, os cabelos novamente lisos, os lábios corados, o nariz adolescente, cantarolando na cabeça as mesmas velhas músicas que um dia gostara de enjoar.
   - Droga! – exclamou sua antiga voz.
   Já era a décima primeira vez esse mês.