sexta-feira, 29 de janeiro de 2016

(o)pressão

Pode não parecer
(apesar de ser gritante)
mas eu cresci.
Não sou mais
a criança frágil que precisa de orações
ou mandinga de entidade
pra ficar protegidinho
que do útero eu já saí
faz
vinte e quatro anos
Vinte e quatro anos!
Vinte e quatro anos
que me engastrita
a preocupação
se eu comi, se eu dormi
se eu to levando blusa
se eu to trabalhando
se eu arrumei a cama
se eu faço tudo direitinho
se eu to longe da bebida
se eu parei de usar drogas
por que estou triste
se eu devo ser feliz?
Não vou considerar
o amor que tem por mim,
o cuidado e a carência
se misturam e em paciência
me cozinham até eu estragar
como já me cozinhou
e é por isso que eu pulo fora
antes que passe a hora
e Plutão dê adeus à Lua
sem isso se consertar.

Castigo indireto
de quem eu passava a mão na cabeça
por gente infeliz
que merece a redenção em consciência
marcaram profundamente
a psique de uma criança
que só hoje
oitomilsetecentosesessentaesetedias depois
floresce na razão
que a sua pedra filosofal
é por causa dessa ferida
opressora
infeliz
merecedora de punição
de prisão
de qualquer coisa que afastasse
a mulher que um dia
e por tanto tempo
me maltratou

E onde estava a minha protetora?
O meu mundo?
A própria Terra que me acolheu?
Onde estava a Gaia materna
capricorniana
no momento crucial?
Era como se por conta da não obediência
da rebeldia
um deus perverso me arrancasse do paraíso
e me jogasse direto no inferno

E quando me vejo Parsifal
embasbacado ante os cavalheiros na mata
saio
saio mesmo
empenhando a jornada
que acabou por me trazer pra casa
pra infância desperdiçada
com gente mal amada
mal humorada
a fim de ver e olhar
e, quem sabe, recuperar
o Graal perdido que um dia caiu
e me deixou a navegar
ferido num barco à beira mar
sem força pra guerrear
ou pra de vez afundar.

A quem serve o Graal?

Nenhum comentário:

Postar um comentário