sexta-feira, 14 de fevereiro de 2014

Ciência

Ele vivia uma vida verde, como banco de metrô. Sabia disso, por isso - descobrira - não se bastava. Sofria sem concatenar significado, dormia e acordava mau humorado, nada balançado, pelo contrário, sentia-se cristalizado. Não tinha ida nem vinda que o satisfizesse. Comida, bebida, luxúria, droga... nada, queria encontrar mesmo a fuga da fuga, o ponto além, pois o aquém não fazia sentido.
Por isso vagava, como um zumbi a quem tivesse comido o cérebro, sedento. Nada esperava, nada vinha, não sabia o que pensar, sabia que não adiantava forçar, então sobrevivia
verde
como a manga podre que se suicidara antes de se tornar útil.
Mas um dia o Universo veio em seu socorro, num dia ímpar, após a queda da chuva que há meses se ausentara.
Havia uma porta em sua habitação que nunca dera atenção por não saber pra que servia. Interessou-se por ela por não ter mais pr'onde correr, interessou-se por ela porque tinha esperanças de se fechar, então, esperançado como quem conta os dias na cadeia, abriu-a: um infindável negrume estrelado se materializou diante dele, com borrões velozes de luzes que eram lançadas por mãos invisíveis, orbes magníficos que giravam sutilmente, pedras flutuantes, aeronaves emitindo luzes, buracos profundos que pendiam no nada, fendas de cores nunca vistas, olhos gigantescos, e um som intenso e interno, que cantava duas letras ininterruptamente, como um mantra - tudo numa dança harmoniosa que expandiu toda a existência daquele homem parado no capacho como um perdido, recebendo sensações chocantes da contemplação da grandeza de tudo. 
O plano nunca visitado inspirava tanto medo quanto fascinação
mas
agora
já era 
impossível voltar atrás.
Engolira a chave daquela porta
mas a mantivera aberta.

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