domingo, 18 de dezembro de 2016
hierofando
ainda que eu chore o quanto nunca
Eu sinto vontade de comemorar
abrir qualquer bebida
e brindar
Dessa vez a troca de pele tivera nova intensidade
com o olhar mais apurado
vi
um rasgado e arrastado
eu
e outro despontando como a manhã
É que o sofrimento
tem uma facilidade
uma praticidade
que ver o novo assim
assusta
E é por esse susto que eu brindo
pela oportunidade de renascer
e amar
domingo, 11 de dezembro de 2016
pra sair
obrigado
até logo,
dor
estou aprendendo a lidar
com esse sentimento
que não sei nomear
Dizer amor é muito pouco
ou muito demais
só sei que ele me toma
e me modifica todo
bagunça meu cabelo
me desnuda
me leva pras profundezas
e me deixa estarrecido
e eu desconfio
oxi!
que negócio é esse?
eu sei que eu pedi
mas...
Peraí, eu pedi?
Eu pedi!
Você então é o meu desejo
(e dos profundos)
Você chegou, não é mesmo?
Já ta aqui me fazendo feliz
e me fazendo...
em outros tempos eu diria, convencido,
a palavra "sofrer", mas hoje
conscientemente,
aplico, do início:
Já ta aqui me fazendo feliz
e me ensinando que é preciso
aprender a sofrer
Eu preciso poetizar esse romance
e dizer que nos encontramos
quando Júpiter, Vênus e Plutão se misturaram
em nosso mapa astral
o que é uma realidade
mas escrevo na esperança de...
sei lá porquê escrevo
já nem lembro mais
tomei você pelos pensamentos
e me distraí
Estou aprendendo a lidar com você
e, principalmente,
com esse novo eu
pois nossos furacões se encontraram
e causaram aquele revoo
E até minha dor levantou voo
rasgou minha pele e bateu asas
e me deixou com um eu tão novo
que ainda preciso me acostumar a me amar
te amando
quinta-feira, 8 de dezembro de 2016
sempre
não porque está feliz
mas porque vive
porque canta e dói
às vezes dói de passado
às vezes se aperta de futuro
canta
porque está apaixonado
se retrai porque tem medos
Medos que movimentam
tão intensamente o rio das minhas veias
que sou obrigado a me transformar
a encarar
a superar
e a compreender
Saber sofrer
Meu coração está em festa
porque está vivo
e mais
porque estou vivo
festejo o coração que me festeja
pela consciência que a vida é um bombear constante
é nascer e morrer
subir e descer
sempre em movimento
sempre em frente
sempre
terça-feira, 6 de dezembro de 2016
olho pro passado
segunda-feira, 21 de novembro de 2016
Vamos andar...
Hoje eu quero expor você na rua
quero pegar na sua mão
e mostrar pra todo mundo
o homem que me apareceu
Beijar teus lábios diante de um letreiro luminoso
Te agarrar no meio da vitrine
Apertar tua bunda entre o um e o dois
do relógio digital de referência
De preferência
chupar o teu pescoço e escutar o teu gemido
ecoar dentro de um túnel
Quero sorrir pra você
e te ver enlouquecer
quando a câmera pousar em nossos rostos
e a repórter perguntar
por quê gostamos tanto um do outro
Quero andar abraçado com você
com o homem que você é
com todas as coisas que sei
e as que eu não sei
com as que eu gosto
e as que eu não descobri ainda que não gosto
Quero me libertar na nossa intimidade
te aprisionar em meus braços
salivar de saudade
do ritmo do teu coração quando encontra o meu
Hoje eu quero você
E sei também que você me quer
Vamos andar...
segunda-feira, 17 de outubro de 2016
efeméride de 2013
perambulando em meu ser
feito alma penada
no caminho perdido mas rumado
consciente da caminhada
a caminhada perdida
destinada a se encontrar
Para que não imploda
e para que não exploda
ninguém
falo sobre seu silêncio
e silencio o meu falar...
quinta-feira, 8 de setembro de 2016
o infeliz do metrô
No meio do fluxo do sobe e desce, antes da escada rolante, há um homem ajoelhado, com as mãos estendidas, como se em sua testa houvesse uma placa escrito PEDINTE. Vestia uma camiseta verde suja e rasgada e os pés secos saíam por baixo da barra furada de uma calça que era quase um pano de chão. O fôlego fugiu de mim assim que botei os olhos sobre ele e o calor incômodo da indignação subiu pelo meu peito. Não me atrevi a olhá-lo duas vezes. Subi as escadas com um comichão nas minhas orelhas e marchei até o meu escritório. Fiquei com aquele homem o dia inteiro na cabeça.
Quando entrei na minha sala, me dei conta de que não correspondi ao bom dia da Marli, secretária. Fechei a porta, os olhos, abri a boca, torci meu pescoço e tentei me concentrar nas minhas coisas. Às 10h tive uma reunião e, enquanto o Márcio chato falava, pensei de novo naquele maltrapilho. Só de pensar em lhe dar dinheiro fiquei escandalizado. Que é que aquele sujeito estava pensando?
Às 11:45 saí da reunião e ao meio dia já estava pronto para almoçar e o fiz, com aquele velho na mente. Interagi o que pude com meus colegas e tive que tomar um antiácido pra comida descer.
Às 14h eu avistei da janela um mendigo do outro lado da rua, e fui parar novamente no metrô, com aquele infeliz ajoelhado ao pé na escada. Não sabia por quê ele me incomodava tanto. Visualizei a mim mesmo erguendo aquele miserável pelo que restara de sua gola suja e prensando suas costas ossudas contra a parede, depois me vi estendendo-lhe a mão, me vi dando uma bofetada em seu rosto, me vi até beijando seus lábios. Me deparei, então, com a hora de ir embora e tentei compensar as ignoradas de mais cedo com sorrisos, não foram muito verdadeiros, mas surtiram o efeito esperado, o povo sorriu e eu parti.
Como uma história já escrita, reencontrei o velho no metrô.
Estava ainda naquela posição humilhante. Será que saíra dela em algum momento? Desci devagar dessa vez e reparei que ninguém lhe dava moedas, na verdade as pessoas o evitavam. Quando cheguei mais perto, meu primeiro impulso foi o de gritar "levante-se!" com toda ferocidade que podia reunir, mas não o fiz. Passei por ele e, para a minha surpresa, nossos olhos se encontraram. Por milésimos, esquadrinhei seus grandes olhos verde-musgos, pareciam dois faróis apagados, afastei os meus depressa e segui catraca adentro, o coração aos pulos.
Não acordei pra trabalhar na manhã seguinte, tampouco me deitara pra dormir, sequer chegara em casa. Era que, daquele momento em diante, alguma coisa dentro de mim passou a esmolar também, e eu não conseguia me concentrar em outra coisa, só em matar a minha fome.
sexta-feira, 22 de julho de 2016
mercúrio
fazem as conexões neurais
e a solitude não é solidão
é quando estou só
só eu
encontram caminhos
- eu
e sabem de tudo
só eu
seguros do mundo
pacíficos
quarta-feira, 20 de julho de 2016
dor
contorço minha alma
dou a volta por baixo
e miro o fundo da escuridão
bem lá
eu encontro a luz
cada luz maior que a outra...
quanto mais fundo eu procuro
mais eu quero descer
e então tem que parar
pra poder sobreviver.
terça-feira, 5 de julho de 2016
Pentagrama
É dia de Netuno retrógrado
e a cidade está sem água
o tempo
seco
parede árida
sol amarelo
o mago se droga
e se vê no espelho
das palavras de agora
a caverna de sol em que se enfiara.
Destrincheirei minha poesia
de profundo arcabouço
próximo ao centro,
perto dos monstros
sonsos eles saíram
e dançam comigo
na mata do ritual
com o velho amigo.
quinta-feira, 23 de junho de 2016
instante
o fluxo da vida
sem saber onde vai dar
quem vai interromper
como e por que começou
na infinitude de possibilidades
minha boca encontrou a sua
no fluxo da vida
no fluxo da saliva
a gente se misturou
por alguns segundos
me perdi de mim
você se perdeu também
e fomos aquele instante
quando acabou
passou
domingo, 19 de junho de 2016
endurecer
quando os tempos são de mergulhos
endurecer
para que o outro amadureça
perca os apoios
e encontre sua fortaleza
você pode ajudar na polidez da pedra bruta
ou na exposição de seu verdadeiro rosto
segunda-feira, 6 de junho de 2016
que chova!
vida interior,
como novidade,
rasteja sob a pele
e abre
e da vazão
necessário
imprescindível
imutável
ciclo da vida
e a gente
nasceu
pra ser nós mesmos
segunda-feira, 30 de maio de 2016
em andamento
Tilapiando informações
faço jorrar canções
e expurgar
como quem espreme uma espinha gigante
todo temer que se alojou na coluna
os fora dilma dos pulmões
e os vai trabalhar, vagabundo que entopiam veias.
Que poeta sereno
num país perigoso
onde quem tenta
morre
quem protesta
apanha
quem rouba
faz?
um poeta doente
de poesia doente
que versa sobre a doença
o poeta esperançoso
que fala dos ciclos
do corpo
primeiro
do corpo
timoneiro
do mundo
do corpo
do poeta mundo
se regenera das chagas
que adquiriu
Eu tava la e vi
sair de dentro
o sangue estancado
em anos de repressão
vi sair na agulha
os fantasmas do medo
da insegurança
da liberdade estagnada
e agora é o corpo
um campo
onde a saúde e a doença
convulsionam
É o meu corpo
estranho pra mim
nasci aqui e quero fugir
me rebelo
vejo-o em domínios trevosos
cancerígenos
agentes
(políticos?)
sugam o que foi duramente conquistado
por anos
esse é o lugar onde cresci
e querem tirar de mim
de nós
esse corpo
esse mundo
que
como ninguém
precisa de tratamento
assim,
quem sabe,
eu possa me sentir país
me sentir corpo
me sentir alma
me sentir espírito
me sentir eu
me sentir você...
domingo, 29 de maio de 2016
fim de outono
algo acontece
levantou-se o véu
e
em que parte do caminho me perdi?
que lugar é este
onde estou?
quem me colocou aqui?
algo terrível está acontecendo
e é melhor não se afastar
da luz que brilha no peito
que é a luz do universo
mas que agora é tão pequenina
que é normal desanimar
entra o inverno neste hemisfério
e é tempo de se recolher
quarta-feira, 25 de maio de 2016
Que querem?
todo artista
toda arte
toda forma de amor
de amar
toda tentativa de desembrutecer o ser humano
toda forma de visão libertadora
libertária
caminhos de renovação
Toda experiência transcendental
Que querem de nós?
que viremos máquinas
que fiquemos ignorantes
que sigamos a direção que aponta a caneta do engravatado
?
Querem a nossa submissão?
Pois,
saibam,
não é passivo o novo mundo
a consciência cresce
porque a liberdade interior é maior
e se um governo
que deveria ser PARA o povo
não acompanha essa evoluçã
então
ele
deve
cair,
terça-feira, 17 de maio de 2016
entramelando as dores do mundo
vozes secas
vociferando
isentas
dessa dor
relampejam
sonoras
vendendo canções
sabendo de si e mais nada
levando ventilação
aos dutos do cérebro
versando essas dores
anestesiando outras
de dor em dor a gente se ajuda
a sua dor lapidada
alivia a minha
e a inspira a inspirar
com nossas dores
portanto,
a gente sara o mundo
é só entramelar
compartilhar
e doer.
sexta-feira, 13 de maio de 2016
para
lucidez mesmo
onde o presente não faz sentido
nem incomoda
Onde o registro do passado
não importa
e o futuro, bem importante
nada
É um momento de pleno poder
conhecimento de energias
sabedoria pra executar
como um canal
o que o universo mandar
é fluidez no caminhar
é raio de sol
é um instante de vida
vida mesmo
que nos atravessa
como um raio
necessário
no campo estagnado
de um presente arbitrário
complexado
enfermo
necessário
lucidez, seu moço
lucidez...
cérebro-vida
ilusões
cobaias da indústria
do sistema que te pariu
quem não vê
retornou aos braços da mãe merda
e conformado
se dopa
de dinheiro
com discurso de trabalho
whyskas sachê pro gato
jornal nacional pro vazio
craniano
é quase
edipiano
o que faz com o próprio corpo
fode, droga
geme na agulha
se arrepende
chora, compreende
elixir é promessa de cura
se cega pra não ver
a tragédia acontecer
disfarçadas de milagres que vão sugando
sugando
as entidades
as energias
o disco solar
que tava aí quando cê nasceu
agora é vinil riscado
virando na chapa
pra sentir-se um pouco...
garoto,
cê é louco!
quarta-feira, 11 de maio de 2016
plagas distantes
plagas embasibadoras
descaftenize o cosmos
para que o caos prevaleça
antes da nova civilização
que embotará as trevas
e as farão nossos olhos
tamanha claridade
olhos
O sol nasceu pálido
pintando de sombrio o dia que despontava
com o céu enfeitado de gélidas nuvens
realçadoras dos prédios da cidade
com luzinhas acesas desde a madrugada.
A manhã escorreu sobre o solo
encheu de esperança um coração bem aquecido
e inspirou os de alma expessa e profunda.
Foi bom que nasceu
Mas há olhos que só querem dormir
vago
pois
entre
os dois
um não desconhece a dura realidade que o sonho não pode mais cobrir
e o outro vê que as nuvens foram soberanas
pelo menos onde o sol
dessa vez
não pôde ser poesia.
terça-feira, 19 de abril de 2016
2016
a vontade é de se drogar
se dopar
se embriagar até que alguém nos esqueça
fugir daqui
desse país
desse planeta
não estamos em 64
de jeito nenhum
então é bom mantermos os nossos corpos saudáveis
a mente lúcida
e o coração aquecido
para lutar como nunca lutamos antes
contra os primatas que querem deter a evolução do país
não vamos enlouquecer,
nem nos matar,
nem desistir.
Pelo contrário: vamos ficar ótimos e incomodar bastante ainda
quinta-feira, 14 de abril de 2016
SOFREGUIDÃO SILENCIOSA
quarta-feira, 13 de abril de 2016
então...
você trabalhou a vida toda
com o peso que as condições permitiram
para sentar-se à beira da cadeira
de um salão de bifê barulhento
com a mesa posta
canto
pra comer comida cara
e ter os tímpanos violentados
na festa de aniversário da sua filha
ou neta
ou sobrinha
ou qualquer uma
importante o suficiente pra obrigar sua presença.
Que importa quem arruma a mesa
quem limpa os copos
quem serve o drink?
O que importa é que a festa corra bem
sem interferência
pra alguém se sentir feliz
no show da ilusão que a vida se tornou
desde que escolheste
olhar somente
pra si.
hey
você queria isso mesmo?
um rito vazio
que sobrou aparência
inveja sorrateira
ostentação
pra ser vista por alguém
já que seus pais
nunca te olharam?
você queria isso mesmo?
Hey, debutante
você realmente queria isso?
mal pode se mover
mal pode andar
não pode borrar
não pode chorar
é obrigada a sorrir
pra todo mundo aplaudir
(como manda a etiqueta)
e amanhã
amanhã esquecer
voê queria isso mesmo?
Hey, debutante
você queria isso mesmo?
ser o centro das atenções
da carência emocional
da culpa paternal
do abandono maternal
do vampirismo e escapismo
você não tem culpa, debutante
ninguém tem
mas você não queria isso
com certeza você não queria isso
mas agora é tarde
e a ti só resta
dançar
brilhar
terminar a noite
e anos depois
quando a festa acabar, debutante
você chorar
e,
quiçá,
conscientizar-se que o mar
ah, o mar, debutante
é tão
tão além do que imaginamos
tão além, debutante
mas eu sei que você não queria isso
um dia
debutante
isso vai acabar.
domingo, 10 de abril de 2016
arcaico
sexta-feira, 8 de abril de 2016
Interpretação
Esses tempos de passagem
terça-feira, 29 de março de 2016
(re) brotar
a serviço da saciedade
sede
pois
seu sexo servido sobre si
seguindo caminhos seguros
sua sedução
sóbria
sem prisões
cintila na noite
na escuridão alquímica
às escondidas
às avessas
como um adolescente
de novo
na pura descoberta
de si da sede
que movimenta o sangue
sinaliza passagens
dessedimenta o passado...
Sossega a alma, menino
estás vivo
pulsante
a seca foi-se embora.
quinta-feira, 17 de março de 2016
Ciclo
sábado, 12 de março de 2016
atualidade
pra dispersar fantasmas
que à frente flutuam,
os famosos fantasmas
que estreitam em nossa consciência
e se diluem no cotidiano
naquela hora
onde podemos encontrar sua origem,
nos afastamos para a caverna
pra assistir a vida pela parede fácil
pra dopar a dor com luz azul-ventre
e confortar nossa existência
com a chama da importância
como as velas falsas que acendem nos modernos santuários
ao depositar uma moeda.
lutamos guerras iludidas pelo Tempo
rastejamos em busca de elixires
disfarçamos o desespero com dignidade
forçamos as sinapses a se transformarem
e acreditamos
acreditamos fortemente
porque
não há outro caminho.
ou abnega
ou se afoga na cama.
domingo, 6 de março de 2016
a pele adequada
festa rica num buffet de são paulo:
a debutante que viajou o mundo
os pais com olhos estalados
a esquisita e ordinária dona da propriedade
e o dono - velho, ereto e com o olhar de quem dirige o mundo
por fim, os amigos
gente fora de si que dança funk pela metade e curte sertanejo universitário
A festa estava pronta!
ah, também tinha eu
que ia trabalhar
tinha os seguranças que iam guardar
(agindo como leais cães de guarda)
e todo o pessoal da senzala
mas esse pessoal nunca é importante.
Figurino dos homens:
aquilo que chamam de esporte-chique
deve ser coisa de jogador de futebol que ficou rico
o tipo de roupa que o Neymar usou quando foi depor
todo mundo igual, só variando a cor da camisa
Figurino das mulheres:
roupa brilhante e brega que não se usa em mais nenhuma ocasião
sapatos rasga-pele
em geral loiras, de cabelo liso
Havia uma negra,
mas ela estava muito embranquecida.
Eu não estava de figurino
estava vestido normal
camiseta verde
all star surrado
e uma calça discreta.
A festa já estava rolando
a mãe reclamando
a aniversariante segurando seu psicológico
os adolescentes tentando agir como adultos
a música:
in
su
por
ta
vel
men
te
alta
(e olha que eu já frequentei uns bate-cabeças
e sou adepto da boate viado com catuaba)
tocando americanices
e música de projeção da frustração.
Era impossível não ver o problema da divisão de classes
ele pairava sobre o ambiente como um fantasma
sugando tudo e a todos
quem via era oprimido
quem não via já estava abduzido
ou pelo menos havia esperança.
Não era possível suportar sóbrio.
Bebi cerveja
depois um vinho caro
depois mais cerveja
mais um pouco e eu tinha bebido o uísque
fiquei de canto
lubrificando a mente
um segurança me fitou
Circulei
bebi mais um pouco
assisti aos clipes que passavam no telão que
curiosamente
era música da favela
começou a tocar música da favela
com clipes na favela
letras sobre a favela
e os caras cantando
os preto e os branco
era muito estranho.
Resolvi dar um descanso pra mente e entrei na
"área reservada para pessoas autorizadas"
eu era uma pessoa autorizada
eu ia trabalhar na festa
ali era meu camarim
e eu já tinha entrado e saído de lá pelo menos umas cinco vezes.
Entrei
e antes mesmo que pudesse me abaixar até a minha mochila
pra pegar uma roupa de frio, uma vez que o ar condicionado estava assassino,
entraram
como cães de guarda
como quem da um pé na porta
dois seguranças
o que me fitou,
com seu radinho enfiado na orelha,
e um outro de rosto pontudo
negro
me olhou fixamente e perguntou com quem eu estava
- com o mestre de cerimônia.
- ah tá...
- to com cara de penetra? - disse eu colocando a blusa vermelha
era moletom, foda-se
- não...
tentou explicar que tinha lista e ele não tinha me visto entrar
foda-se
olhei com essa cara
foda-se
E me sentei no cubículo que me era permitido esperar.
Não sou negro
sou branco
mas
por um minuto
me senti como os garotos e garotas negras
que são perseguidos em lojas e supermercados
realmente
dói
é revoltante
é bizarro
uma série de sensações
e isso porque meu figurino não estava adequado
e pra quem não tem a pele adequada...?
segunda-feira, 22 de fevereiro de 2016
momentos
não vou mentir
doeu
não deu pra ser outro
pra se enquadrar
não deu pra não estar
ali
imperfeito
tentando segurar o escudo
mas abrindo mão da espada
os pés e os olhos fincados na terra
no pico da lua cheia eu,
como não poderia ser diferente,
transbordei
descarreguei as pústulas
liquefazendo de pus e saindo pelos poros
E você,
olhos brilhantes
aparência plutoniana
lindo como sempre
menos saudável do que eu gostaria
mas o eu, ali, já não tinha sentido
aqui, contudo, era o mais importante
Hoje sofri
apertei meu coração até sorver a última gota de você
mas ainda escorre
E a vida é assim
a gente vai avançando nos descompassos
desacertos
desalinhos
desencantos
dançando no verbo
versando no dorso
engarrafando a lágrima
pra poder jogar no mar
e ver se alguém pega e a transforma em riso
alguém dentro
alguém fora...
sábado, 20 de fevereiro de 2016
realidade submersa
o céu em gozo
chovendo êxtase
chegou no pico do calor
do amor
e gozou
aguou as plantas
e as pedras
e apagou oceano adentro
todo fogo
sol e lua submersos
corredeira-rio
fez da cidade a mata escura
e do céu o fundo do mar em delírio,
escoando o que passou
o dia todo acorrentado.
Fertiliza pra dentro
germina profundo
goteja furando o teto
por entre as fendas
as paredes
e pinga até onde não deve,
sendo o que é,
água nos olhos e no peito
a profunda rachadura que veio pra fazer
e pinga até onde não quero
fazendo o que deve
sem dar satisfação
agindo na não ação
aí, ó,
fazendo da vida uma miração.
terça-feira, 16 de fevereiro de 2016
Marte/ Netuno
segunda-feira, 15 de fevereiro de 2016
sobre amores perigosos IV
...é planta que cai
morta
queima em árido território
intensifica sua existência
emana de si
até a última gota
e, por fim,
irrealizada
sem raízes
morre
seca
sem graça
no meio da rua
pobre
desesperada descansa
a lua é abandonada
trará novos ciclos
novas sementes
fará crescer ou morrer
o que precisa
crescer ou morrer
que a natureza não é besta
e há de prover.
sobre amores perigosos III
... é dor que sangra o coração
sem fim
vida que nasce em dores de parto
geme
até agora
rasga
o peito
e é como uma criatura dolorosa que
nasce
sobre amores perigosos II
já tem um tempo que você anda
fresca no peito
desce abrindo
caminhos
canais